sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

BARROCO

GREGÓRIO DE MATOS


Gregório de Matos (1636-1695) foi um poeta baiano do século XVII conhecido como “Boca do Inferno”. Esse apelido foi devido ao fato de, em seus poemas, criticar a Igreja católica, as autoridades locais e os costumes de seus contemporâneos em geral. Nasceu em Salvador, no tempo em que essa cidade era a capital do Brasil Colônia. É considerado o maior poeta do Barroco brasileiro.

Observe de que maneira ele descrevia a cidade de Salvador, sede do governo colonial.

"Descreve o que era naquele tempo a cidade da Bahia"

A cada canto um grande conselheiro,
Que nos quer governar cabana e vinha;
Não sabem governar sua cozinha,
E podem governar o mundo inteiro.

Em cada porta um bem freqüente olheiro,
Que a vida do vizinho e da vizinha
Pesquisa, escuta, espreita e esquadrinha,
Para o levar à praça e ao terreiro.

Muitos mulatos desavergonhados,
Trazidos sob os pés os homens nobres*,
Posta nas palmas toda a picardia,

Estupendas usuras** nos mercados,
Todos os que não furtam muito pobres:
E eis aqui a cidade da Bahia.

*Na visão de Gregório de Matos, os mulatos em ascensão subjugam com esperteza os verdadeiros “homens nobres”.
**usura: desejo exacerbado de poder e riqueza; cobiça.

A Bahia de dessa época aparece com um tom nostálgico, e o poeta faz uma crítica à decadência moral e econômica da cidade naquele momento. Os comerciantes são os detentores do poder político e econômico e agem de maneira oportunista, enquanto os trabalhadores honestos encontram-se na pobreza.
Trata-se de soneto satírico e, como todo soneto, é composto por versos decassílabos em esquema de rimas ABBA, ABBA, CDE, CDE.



Vemos essa mesma inconformidade e lamentação em outro famoso soneto "À cidade da Bahia", onde percebe-se a decadência dos engenhos de açúcar e a ascensão de uma burguesia oportunista.
À cidade da Bahia
Triste Bahia! oh! quão dessemelhante
Estás e estou do nosso antigo estado!
 
Pobre te vejo a ti, tu a mim empenhado,
Rica te vi eu já, tu a mim abundante.

A ti trocou-te a máquina mercante,
Que em tua larga barra tem entrado,
A mim foi-me trocando e tem trocado
Tanto negócio e tanto negociante.

Deste em dar tanto açúcar excelente
Pelas drogas inúteis, que abelhuda
Simples aceitas do sagaz Brichote.

Oh! Se quisera Deus que, de repente
Um dia amanheceras tão sisuda
Que fora de algodão o teu capote!
Fonte: Spina, S. 1995. A poesia de Gregório de Matos. SP, Edusp.



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