Avenida Santo Amaro.
Às 13 h.
Um homem malvestido para em frente a
uma concessionária de automóveis fechada e nota as bolas promocionais amarradas
à porta.
Um policial desce da viatura, olha
para todos os lados e observa um suspeito parado em frente a uma
concessionária.
O suspeito está malvestido e
descalço.
Uma senhora sentada no banco do
ônibus que para na avenida para pegar passageiros comenta com a moça sentada ao
seu lado que tem um mendigo todo sujo parado em frente a uma loja de
automóveis.
Um senhor passa por
um homem todo sujo, segura a carteira e começa a andar apressado. Logo que nota
a viatura estacionada mais à frente, se sente seguro, amenizando os
passos.
Um jovem tenta desviar de trás do
ônibus parado, os policias que ele vê logo à frente lhe trazem desconforto,
pois seu carro está repleto de drogas que serão comercializadas na faculdade
onde estuda.
O homem malvestido resolve
agir, dá três passos à frente, levanta as mãos e agarra duas bolas
promocionais; faz a conta rapidamente e se sente realizado, quando pensa que ao
vender as bolas comprará algo para beber. Uma moça alertada pela senhora ao seu
lado no ônibus, chama a atenção de vários passageiros para o homem que, segundo
ela, é um mendigo, e diz alto que ele acabou de roubar algo na concessionária.
Um jovem com o carro cheio de
drogas para vender na sua faculdade nota o homem correndo com duas bolas e dá ré
no carro ao ver os policiais vindo em sua direção.
Um policial alcança o homem
malvestido e bate com o cabo do revólver em sua cabeça várias vezes; o homem
tido como mendigo pelos passageiros de um ônibus em frente cai e as bolas rolam
pelo asfalto.
Um motorista que dirige na
mesma linha há oito anos tenta ficar com o ônibus parado para ver os policiais
darem chutes e socos em um homem malvestido que está caído na calçada, mas o
trânsito está livre e ele avança passando por cima e estourando duas bolas
promocionais.
FERRÉZ, Ninguém é
inocente. Rio de Janeiro: Objetiva, 2006.
Nenhum comentário:
Postar um comentário